Edições

Edições

As edições genéticas dos manuscritos camilianos ‒ Apresentação

Reunem-se aqui edições genéticas de manuscritos autógrafos camilianos, começando com a edição dos autógrafos da Colecção Camiliana de Sintra, O demónio do ouro, O regicida, Novelas do Minho, História de Gabriel Malagrida e A caveira da mártir. Estas edições podem ser vistas em articulação com os respectivos manuscritos, disponíveis em «Arquivo Digital». Espera-se, no futuro, vir a publicar edições genéticas de outros manuscritos de Camilo pertencentes a bibliotecas públicas.

A edição genética representa por meios tipográficos a criação de uma obra tal como ela se documenta em um ou mais testemunhos autógrafos. Para isso, reproduz o texto escrito pela mão do autor sem nenhuma intervenção editorial nem na substância (não corrige erros), nem na língua nem na grafia do testemunho, conservando mesmo as abreviaturas usadas e, de modo aproximado, a disposição da página. Este critério de total conservadorismo constitui uma das principais marcas da edição genética.

Outra marca é a de representar de modo figurativo os movimentos desenhados pela mão do autor sobre o papel: as mudanças de vontade do autor manifestam-se quando ele risca segmentos de texto, substituindo-os ou não por outros ou quando os acrescenta, usando para isso o espaço interlinear ou ‒ no caso de Camilo, mais raramente ‒ o espaço marginal e o verso dos fólios (habitualmente escritos apenas no rosto). Estas emendas pode o autor fazê-las em curso de escrita, isto é no momento em que está a conceber pela primeira vez um enunciado e ainda tem o espaço livre na linha à direita da escrita ‒ são as chamadas mendas imediatas ‒ ou quando volta atrás no texto já escrito e o relê, estando, portanto, a linha já ocupada com escrita à direita do ponto que vai ser emendado ‒ caso em que as emendas serão mediatas.

A edição genética usa uma série de sinais convencionais destinados a representar os processos de emenda do texto praticados pelo autor. O mais importante, nestes sinais, é que eles permitam separar e hierarquizar as várias etapas percorridas pelo autor na escrita e na revisão do seu texto. Em primeiro lugar, importa distinguir as emendas imediatas (feitas em curso de escrita) das emendas mediatas (feitas em processo de revisão), porque é esta uma distinção cronológica fundamental. Seguidamente, importa estabelecer a cronologia relativa das emendas mediatas, sendo por vezes possível descobrir quais foram produzidas durante a mesma fase de reescrita. Esta informação chega ao editor através da observação dos aspectos físicos da página, como, por exemplo, a topografia da escrita: o lugar da inscrição da emenda no suporte revela-nos a sua cronologia relativamente às restantes emendas; o instrumento de escrita utilizado ajuda a reunir as emendas contemporâneas; a sobreposição de traços pode indicar qual é o mais antigo. A escrita de Camilo tem algumas particularidades a este respeito, que aqui não podem ser desenvolvidas. Registe-se, apenas, que, com certa frequência inscreve uma emenda imediata total ou parcialmente na sobrelinha, por cima das palavras riscadas, apesar de ter espaço livre na linha à direita; neste caso, a edição genética não representa por sinais o entrelinhamento, pois se trata de um caso de escrita contínua; o entrelinhamento, se fosse marcado por sinais, seria entendido como mediato, em prejuízo da reconstituição cronológica.

São os seguintes os sinais usados nas edições:

segmento <cancelado>

segmento [adicionado na linha mediatamente]

segmento [↑ adicionado na sobrelinha mediatamente]

segmento [↓ adicionado na sublinha mediatamente]

segmento [← adicionado na margem esquerda mediatamente]

segmento [→ adicionado na margem direita mediatamente]

segmento <substituído>/sobreposto\

† segmento ilegível

*leitura conjecturada

As edições genéticas não representam apenas a escrita, as escolhas e os acidentes dos manuscritos autógrafos. De facto, a história do texto prossegue com as suas edições sucessivas, cujos acidentes têm igualmente interesse genético, se tiverem sido originados no autor. Depois de entregar o seu manuscrito ao editor, este encarregava um tipógrafo de compor o texto, tarefa não isenta de erros. Tirada uma prova da composição, o autor era chamado a corrigir os erros do tipógrafo. Mas nessa revisão de provas alguns erros podiam escapar à atenção do autor e acabavam por sair impressos, criando-se assim um problema de atribuição que nem sempre os editores conseguem detectar e corrigir. Ao mesmo tempo que revia, o autor não resistia a retocar o seu texto, introduzindo algumas emendas de que não resta mais nenhum documento senão as edições impressas (visto que as provas tipográficas se perderam). Assim, as lições variantes das edições impressas comprovadamente revistas pelo autor devem também ser registadas na edição genética, sem ser formulado juízo sobre a sua autoria (decisão que não é evidente e que pertence, em última análise, aos leitores e à crítica). Estas variantes são registadas entre parêntesis rectos e precedidos do número da edição em negrito:

Lição do manuscrito [1 variante da 1ª edição] [2 variante da 2ª edição]

Das edições, são registadas apenas as variantes substantivas e as variantes linguísticas, deixando sem registo as variantes gráficas. Estas últimas não afectam nem o discurso do texto, nem os recursos da língua, e é pequena a probabilidade de terem sido introduzidas pelo autor. Não deixam, contudo, de ser interessantes quando se pode entrever a personalidade do responsável por elas.

Bibliografia

Castro, Ivo (2008),  «A importância da rasura no manuscrito de Amor de Perdição», O Domínio do Instável (A Jacinto do Prado Coelho), Porto, Caixotim, 161-180.

Castro, Ivo (2012a), «Emendas em curso de escrita», Nada na linguagem lhe é estranho (Homenagem a Isabel Hub Faria) ed. Armanda Costa e I. Duarte, Porto, Afrontamento,  423-432.

Castro, Ivo (2007), «Introdução»,  Camilo Castelo Branco, Amor de Perdição, edição genética e crítica por I. Castro, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda.

Pimenta, Carlota (2009), Edição crítica e genética de «A Morgada de Romariz» de Camilo Castelo Branco, tese de mestrado em Crítica Textual apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

Pimenta, Carlota (2017), O processo de escrita camiliano em Novelas do Minho, tese de doutoramento em Crítica Textual apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

Sobral, Cristina (2023), «Emendas extensivas no romance dum homem rico, de Camilo Castelo Branco», Antes e depois de editar, org. Â. Correia, C. Pimenta, J. Serafim, 115-140.

Sobral, Cristina (2023), «O romance mais querido de Camilo Castelo Branco: emendas incisivas n’O Romance dum homem rico», Camilo Castelo Branco: génese e recepção, org. S. Martins, C. Sobral, C. Pimenta, Lisboa, Bertrand, 279-315.

 

Ivo Castro

Cristina Sobral

 
 
Powered by Phoca Download

Contactos

A CCCB gostará de conversar com todos os que se interessam por Camilo Castelo Branco.

Receberá com agrado perguntas e sugestões.

Email:  cccb@cm-sintra.pt

Cátedra Camilo Castelo Branco

Faculdade de Letras de Lisboa

Alameda da Universidade

1600-214 Lisboa

Ligações

Casa Museu Camilo Castelo Branco (Seide): http://www.camilocastelobranco.org/

Real Gabinete de Leitura  do Rio de Janeiro: https://www.realgabinete.com.br/

 

Órgãos da Cátedra

Conselho Consultivo

Comissão Directiva